sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Mad National Lampoon

A revista americana National Lampoon, satírica e mordaz, numa vertente equilibrada de modo a poder vender ao grande público, aparecida em 1970 pelo génio de Doug Kenney, já falecido, atingiu o máximo da sua circulação em 1974. Mais de um milhão de exemplares.
Em Junho de 1974, por qualquer motivo imponderável, comprei o exemplar, o que voltei a fazer no mês seguinte e ainda depois, mais uma meia dúzia de números até 1976, com a The latest Issue.
A principal atracção da revista, residia no ecletismo temático e gráfico, na publicidade a discos e numa secção especial dedicada aos comics, com papel pardo e monocromático que suportava Gahan Wilson e Vaughn Bode, por exemplo.





















Esta sequência, de duas páginas, é das melhores que se pode ver.





















Esta, por seu turno, em função das cores vívidas da publicidade ao disco Blues for Allah, dos Grateful Dead, contrastando com a capa anterior em papel pardacento e monocromático, é das melhores, de todas as revistas que conheço.























Uma outra revista humorístico saída na América e que serviu de inspiração humorística a muito desenhador europeu ( incluindo Jean Giraud), foi a MAD que congrevava a sátira em desenho e o humor em cápsulas de actualidade, num modo marxista, vertente groucho e parodiava políticos, artistas e actores. Em Dezembro de 1973 a capa e contracapa eram estas:


quinta-feira, 30 de agosto de 2007

Os desvios


O ano de 1974, foi importante para a banda desenhada de expressão francesa. Se alguém me pergunta onde estava no 25 de Abril, a resposta é óbvia: a ler banda desenhada francesa, a desenhar, a ler revistas de música, actualidade e de diversa proveniência e a ouvir música. E assim passei todo o PREC, com incursões em reuniões de discussão cívica contra o comunismo e o poder popular de extrema- esquerda que se aprestava para tomar conta de Portugal. Revivendo essa época, custa-me sempre aceitar que houvesse gente com formação cultural já suficiente para perceber onde levaria a aventura comunista se trilhada até às consequências já conhecidas noutros países e ainda assim, assumissem o carácter científico da evolução social como uma invevitabilidade que nos conduziria à "sociedade sem classes". Muitas discussões públicas e em grupo de amigos, nada adiantaram, porque o poder de influência da propaganda de todos os media da época tinha um efeito letal na consciencialização política. Ainda hoje se sentem e sofrem as consequências de tal estado de coisas, generalizado nos anos setenta.

Nessa altura, andava obcecado positivamente com a descoberta do desenho de Giraud, em Blueberry, mas já se adivinhava nas pequenas ilustrações aqui e ali que algo de novo estava para aparecer.

Tal anúncio, aliás, é melhor explicado pelo próprio Jean Giraud, num livro autobiográfico, de 1999 ( Editions 1) , L´Histoire de mon double. Aí, Giraud, conta que a companhia de autores de bd como Tardi, Jean Pierre Cristin e Mézières ( que desenhou os primeiros táxis voadores que serviram de inspiração a Luc Besson para os filmes dos anos noventa) e ainda Nikita Mandryka, Gottlib e Druillet e a experiência dos comics underground americanos ( Crumb e Corben), através da Mad e dos traços de William Elder, o levaram para outras paragens da imaginação criadora, afastadas do imobilismo da revista Pilote e do seu director René Goscinny que continuava a aposta nas historietas para adolescentes.

As discussões que ocorriam semanalmente nas reuniões da Pilote, motivaram, logo no início da década de setenta, a saída para outras experiências gráficas de diversos autores da Pilote e fatalmente conduziram Giraud ao “Desvio” e aqueloutros a revistas como a L´Écho des Savannes.

O Desvio, é aliás, o título de uma pequena história em meia dúzia de páginas, na Pilote de 11.1.1973, com a família do autor e que relata uma viagem iniciática, em fim-de-semana.

É o próprio Giraud quem reconhece que foi esse o ponto de partida para o desvio real operado na sua obra e ainda assinou Gir, por timidez.












Na França de então, havia ainda uma outra revista que explorava os arredores da imaginação anárquica: Actuel, dirigida por Bizot e que se reportava directamente a revistas americanas, como a National Lampoon e os comics underground de Robert Crumb e alguns outros ( Gilbert Shelton) e franceses como Masse. Na imagem à esquerda, em baixo, aparece como colaborador da revista um certo Bernard Kouchner...












Não obstante, em Março de 1974, Giraud ainda desenha um poster para o primeiro número da revista Lucky Luke, dirigida por René Goscinny. O tema é John Wayne e o desenho é copiado de uma foto de Rio Bravo. Segundo Giraud, Goscinny gostou e no segundo número, o caldo entornou-se porque o desenho glosava o filme My Darling Clementine e Henry Fonda ficava atrás do personagem de segundo plano ( que também fazia de coxo em Rio Bravo). Goscinny não gostou, porque o tema saía do mainstream e apelava já ao desconcerto e ao desvio.

A Métal Hurlant surgiu neste caldo de cultura e as duas imagens que seguem são simbólicas dessas duas facetas da banda desenhada da época, a oscilar entre a adolescência e o mundo dos adultos que a retardam.






















As imagens são todas de arquivo, excepto a imagem da Actuel de Março de 1974, tirada da Rede.

terça-feira, 28 de agosto de 2007

A génese

Em 31 Janeiro de 1974, Gir, ainda na revista Pilote, ilustrou uma recensão a um livro de um escritor de ficção científica e autor de Ubik- Philip K.Dick, e o livro era Clans of the Alphane moon, dos anos sessenta. O artigo vinha assinado por Jean-Pierre Dionnet.
No número seguinte da revista, já como Moebius, desenhou uma historieta sem texto, com dez páginas e que intitulou L´homme est-il bon?




















Umas semanas mais tarde, na mesma revista, o autor Phillipe Druillet publicava mais um episódio da série desenhada, de heroic-fantasy, Yragaël. E Moebius, embora assinando Gir, reincidia na ilustração sobre as maravilhas do universo, de um número todo ele dedicado à ficção científica.




















Com esses três nomes, Dionnet, Druillet e Moebius, nascia, meses mais tarde, no final desse ano, de 1974, um outro projecto, da revista mais fantástica de banda desenhada que me foi dado conhecer: a Métal Hurlant cujo primeiro número apareceu em Janeiro de 1975.

Gir e Moebius

A história de Moebius, tem desenvolvimento diverso. Primeiro Gir; antes disso, Jean Giraud, começou também na revista Pilote, com as histórias de Blueberry, publicadas a seu tempo, na revista Tintin, portuguesa.

Na revista Pilote de 5.4.1973, vista em Agosto de 1974 e inserida no volume 66, aparecia uma sequência de seis páginas da historieta do tenente Blueberry, L´Outlaw.

Essas seis páginas ainda assinadas por Gir, pseudónimo de Giraud, marcam uma nova forma de desenhar o western, na sequência de outras histórias anteriores, como Ballade pour un cercueil; Chihuahua Pearl e L´Homme qui valait 500 000 dollars ou ainda Angel Face, a última desta saga. Qualquer uma destas histórias de western, interligadas na intriga, valem um bom filme do género e o desenho, é dos melhores que Giraud jamais produziu.

Gir era Giraud, aliás Moebius. Tal como Numa Sadoul o retratrou num livro de época, de 1976, com desenho de capa de...Tardi. Em 1991, voltava ao tema e recolhia em volume de luxo, várias entrevistas, incluindo as do primeiro volume e ainda desenhos do mestre.


As duas primeiras pranchas de L´Outlaw de Blueberry:



Jacques Tardi, encore

Jacques Tardi, em 1976, iniciava a publicação da saga das aventuras de Adèle Blanc-Sec, uma heroína, nada como as outras e que viu a luz, pela primeira vez e em continuação, no jornal diário Sud Ouest. O primeiro volume da série, Adèle et la Bête ( Adèle e o Monstro), saiu em álbum cartonado, publicado nas edições Casterman, nesse mesmo ano.

Adèle congrega nas historietas, o mesmo ambiente de uma Paris, de início do séc. XX, com personagens estranhos e lugares míticos.

Depois das histórias de Brindavoine e a sua introdução, em 1974, com a historieta A Flor na Espingarda, a mudança afigurava-se auspiciosa. Tardi, disse depois, numa entrevista, que Adèle era o contraponto feminino à personagem de Brindavoine e numa época em que as mulheres na banda desenhada, se apresentavam de preferência despidas, era refrescante para a imaginação, poder olhá-las de outra maneira.

Ainda em 1974, Tardi, publicava a história Le Démon des Glaces, em álbum cartonado na Casterman e a preto e branco, com inspiração saída das ilustrações de Gustave Doré.


Aqui fica a continuidade da história da Flor na espingarda, de uma poesia literalmente desarmante e que resume quase toda a obra de Tardi.












































Uma flor na espingarda

Jacques Tardi, o autor da capa da primeira ( A Suivre), é um autor francês de Banda Desenhada, nascido em 30 de Agosto de 1946, da craveira dos maiores.

Em Junho de 1974, por ocasião de uma visita à Bertrand de Lisboa, em Junho, havia um filão escondido na secção de banda desenhada da velha livraria da rua Garrett. Uma série de álbuns cartonados que recolhiam vários números da revista Pilote. O primeiro escolhido ( ao preço de 115$00) , com o número 65, abarcava os números 688 a 697, de 11.1.1973 a 15.3.1973.

Em Fevereiro de 1974 ( nº 745) , tinha começado a comprar a revista, semanalmente, porque me interessavam já as novas experiências desenhadas, para além do Tintin- com história na Porta de Loja.

Nesse mesmo mês de Junho de 1974, porém, simultaneamente com a descoberta nos arquivos da Bertrand, a revista passava a periodicidade mensal, e o primeiro número, nesse novo formato, foi uma magnífica surpresa, com a descoberta das primeiras ilustrações de Moebius que começava a largar o espartilho do realismo de Blueberry, para se lançar na ilustração de pequenas histórias de ficção científica.

A Pilote novo formato ( imagem da direita), no entanto, não acompanhava em recheio artístico a anterior experiência que só agora descobria por via dos álbuns de recolha de números antigos que ainda havia disponíveis pelas Bertrands do país. Foi assim que em poucos meses, apareceram mais alguns volumes até ao número 749 de 14.3.1974 e abrangendo já alguns números que comprara em avulso.















Nessas revistas descobri pela primeira vez, entre outros que ainda não vira no Tintin português , Fred, Solé, Mandryka, F´Murr, Bilal, Druillet e …Tardi, que publicava a primeira historieta – Adieu Brindavoine, precisamente nos números do volume 65, da Pilote.

Porém, no volume 70, no nº 743 ( de 31.1.1974), uma pequena historieta sobre a I Grande Guerra mundial, assinada pelo mesmo Tardi, deixara-me então completamente embasbacado, pela cor, pelo tratamento da imagem e pelo tema desenhado. Ficam aqui as primeiras quatro imagens que continuam, a seguir. Até chegarmos a 1976 e às historietas da Adèle "joli brin de fille" Blanc-Sec.














La Fleur au Fusil













































Imagens: capas do volume 65 da Pilote e do primeiro número da série começada em Junho de 1974. Duas páginas da Rock & Folk de Setembro 1976, sobre Tardi e o começo das aventuras de Adèle Blanc-Sec e quatro da celebrada historieta de Tardi, La Fleur au fusil ( que continua)

sábado, 25 de agosto de 2007

Uma parábola sobre a fantasia


A revista (A Suivre), publicou o primeiro número em Fevereiro de 1978 e foi uma novidade de tomo no universo da banda desenhada franco-belga. Nessa época, ainda a passar uma fase de ouro, com novos autores a aparecerem no panorama de outras publicações como a Métal Hurlant, surgida em 1975 e a Pilote que se aguentava desde os anos sessenta, para não falar do Tintin que sobrevivia desde sempre, a banda desenhada, merecia atenção.

Na (A Suivre), toda a preto e branco, Jean-Paul Mougin, prometia dedicar as páginas ao “récit”, à narrativa, “sous toutes ses formes”. Não existe povo sem narrativas, e estas chamam-se mitos, lendas, história, romance, banda desenhada, escrevia o primeiro chefe de redacção da revista. Que contava com o nome de Etienne Robial, o genial designer gráfico da Métal Hurlant e cultor das letras em forma sólida e ampliada e do traço grosso, a negro, a separar os artigos e o enquadramento das colunas de texto.

O primeiro número da revista trazia o início da historieta de Tardi e Forest, Ici Même e ainda, entre outras, Corto Maltese, de Hugo Pratt, na aventura na Sibéria, onde aparece um certo Rasputine.

O último número da revista, foi em Dezembro de 1997, quase vinte anos depois. Nela se publicam várias historietas curtas de vários autores de bd. Um deles, Moebius,( que desenhava para a Métal Hurlant), desenhou estas oito páginas que seguem e que são uma parábola sobre o mundo pessoal da fantasia. Um mundo, onde um simples gesto muda um universo.




































































sexta-feira, 24 de agosto de 2007

Coleccionadores

Um dos coleccionadores que mais admiro, no campo musical, é o inglês Colin Larkin.

A sua colecção de publicações dedicadas à música popular, não tem paralelo conhecido, a não ser nos leilões da ebay.

Colin Larkin, vive com a família na região de Suffolk, e colecciona desde 1961, todas as publicações musicais e ainda discos e livros.

A sua colecção particular de discos, atinge as dezenas de milhar e mesmo assim, muito atrás de tipos como Bob Harris que durante anos apresentou na BBC o programa The Old Grey Whistle Test ( con três dvd disponíveis e imprescindíveis para todo o amador de música popular) e John Peel, já falecido e o maior dj inglês de sempre, descobridor de talentos musicais e que animou nos primórdios dos sessenta, a rádio Caroline, pirata e antecessora das emissoras modernas dedicadas à música popular.

Colin guarda 3000 LP´s; 2000 singles em vinil; 30 000 cd´s; 4000 livros sobre a música popular e ainda comics ( não deve ter nada da bd franco-belga…), suplementos dominicais do Observer e do Sunday TImes, apanhando os anos sessenta e setenta e, cerejas reais no topo deste bolo fabuloso: colecções completas ou quase, de todas as publicações dedicadas à música, desde 1961: cerca de 15 000, com títulos míticos como Sounds, Zig-Zag, Disc and Musica Echo, Record Mirror, Beatles Monthly e os mais correntes New Musical Express, Melody Maker e Rolling Stone. Faltam-lhe, claro, as francesinha Rock & Folk e Best e ainda as alemãs PoP e Musikal Express ( o que não é garantido, porque Larkin, começou a escrever sobre música para uma revista alemã...) e também não li nada sobre a Crawdaddy americana, a primeira revista a sair a público, em 1966, sobre a música popular, (não contando como os jornalinhos que já então saíam periodicamente, num e noutro lado do Atlântico, como Billboard e Melody Maker).

Esta colecção de Colin Larkin é o sonho de qualquer amador de música popular e das imagens e textos associados.

Para quem começou a coleccionar em 1969 e apenas a partir dos anos setenta, logrou apanhar nas bancas, em escrita de Shakespeare, umas Rolling Stone, uns Melody Maker e New Musical Express ou um ou outro Disc & Music Echo, a comparação só satisfaz porque garante que existem pessoas ainda mais maníacas do que outras e ainda por cima, sabem cozinhar ao Sábado à noite para a família ( como Larkin afirma). Ou seja, parecem minimanente normais, o que é sumamente tranquilizante.

A caracterísitica típica de coleccionador de Colin Larkin, revela-se quando afirma que anda à procura de um disco de Captain Beefheart, Strictly Personal. Não, o disco, mesmo em LP, não está esgotado ou desaparecido de circulação como outros. O que Colin pretende, no entanto, é mais raro de obter: um exemplar novo, original e de prensagem americana, ainda fechado no envólucro de celofane que os americanos usavam para embalar os LP´s nos anos setenta. Sei como é, porque tenho discos desses ( por exemplo, Doc Watson, Live & Pickin´de 1979 e ainda Doc and the Boys, de 1981, ambos embalados no cartão pardo e pesado da manufactura tipicamente americana e sem comparação com a europeia e ainda cheiroso da celulose, com o envólucro decorado com o logotipo da Liberty records). E alguns, conservam a fina película de celofane, que obrigam a esforço de cuidados redobrados sempre que são manuseados.

Colin Larkin, colabora em publicações musicais e já escreveu livros sobre o assunto. Não admira nada que tenha sido o autor de uma Enciclopédia da música popular, publicada pela Virgin, em 10 suculentos ( 27 000 entradas) e caros volumes ( à volta de mil euros). Parece que vai tornar-se aberta a consulta pública e online, grátis.

Colin Larkin, além do mais, não gosta de ouvir Elvis Presley, apesar de ter escrito um dos maiores artigos sobre o "king", na sua enciclopédia. Também não gosto. Prefiro, Buddy Holly. Well allright.

Quando a revista Record Collector lhe perguntou, no número de Setembro de 2005, qual era o seu disco preferido de todo o sempre, respondeu: If I Could only remember my name, de David Crosby, do ano de 1971. Eu não saberia responder tão rapidamente e é por isso que vou escrevendo estas coisas, para chegar a alguma conclusão acerca do comportamente. Conhece-te a ti mesmo, dizia o outro…














Imagens: revista Record Collector de Setembro 2005